Arquivo do mês: julho 2018

não temer

Publicado em

eu nunca quis ir embora do meu país

já quis sair de casa

em busca de liberdade

e outros ares para respirar

desejei sair até de mim

pra me encontrar

mas eu quis sair pra voltar

com algo novo pra contar

das sementes que podem brotar

em cantos onde o amor regar

mas não sei se sonho demais

não quero temer

porque o medo fede

mas e esse susto que me assola

ao ver meu país lar

minha terra mãe

tomada por uma doença tão vil

que não sei se nossa terra ainda pode ser fértil

depois de tantas violências

as nossas raízes

tão maltratadas

e agora meu sonho parece mais longe

um devaneio infante

em meio à este espetáculo de horror

protagonizado por monstros em ternos caros

vomitando e alimentando outros monstros

nem sempre tão bem vestidos

mas em essência reconhecidos

na falta de caráter e desumanidade

vocabulário e pensamento reduzidos

da ordem fazem ódio

e progresso

ainda não fui vencida

não estou sozinha

não sei que armaduras podem nos proteger

nem quando foi que nos botaram nesta guerra

estou à margem do abismo

e tento salvar meu sonho da queda

pra que ele alimente a mim

e outros que estão à margem

e cresça

para que ela se alastre

e que nossas armas amores e flores

sejam fortes e luminosos

para acabar com a cegueira

estancar a sangria

e num suspiro aliviado

ver nascer um novo dia

 

alguma coisa meio torta no meu coração

Publicado em

às vezes recobro a razão

em meio ao meu cotidiano

feito de delírios e um vão

um ligeiro engano

às vezes turbilhão

alguma coisa meio torta do meu coração

talvez uma sinapse errante

que me faz acreditar

com aquele desejo puro que um dia alguém batizou

de ingenuidade*

e acabo crendo em tantas coisas

principalmente nas palavras

mesmo as que chegam

com intenções descarregadas ou apontadas

que leio em meu corpo com as luzes apagadas

sentindo as que me rasgam em rajadas

e as que me aninham e acalentam

me acolhendo em suas curvas

tipografias, sílabas, formas, imagens, fonemas

e só pode ser verdade

porque que as palavras não traem

elas não mentem

mas às vezes podem

ser

enganadas surrupiadas usadas

tomadas de assalto

por quem não sabe crer e ser ver d a d e

para encobrir as armas dissimuladas

ferir forjando um afago

mas sou filha da tempestade do mundo

minha natureza é fogo e vento

as flechas que des vio a t i r o

guiada pela minha intuição-Mãe-Vó

que sempre me sopra

as palavras mais bonitas aos ouvidos

e as verdades mais cruas aos sentidos

 

 

*Origem da palavra ingenuidade:
⊙ ETIM lat. ingenuĭtas,ātis ‘condição de ingênuo, de homem nascido livre, sentimentos nobres, honradez, probidade; ingenuidade’

 

 

a palavra mais bonita

Publicado em

li em algum lugar que

saudade é uma palavra

que só existe na língua portuguesa

e não sei como poderia des crê ver

em qualquer outra língua

o que sinto como uma pontada na nuca

que me atravessa de vez em quando

na bagunça dos dias

e daquilo que guardei bem no fundo

de uma solitária

que agora descubro não ser tão bem vedada

e nem à prova de som

e vejo vir à tona tudo que foi calado

num tsunami que

ainda assim

não consigo tocar

o mundo fora daqui

e só por hoje

a f o g o

 

 

los pies que descaminan

Publicado em

para Frida Kahlo

os pés que caminham por ruas tortas

são os mesmos que andam pelas margens das linhas tortas

são os mesmos pés que dançam

sutil ou furiosamente

mas que em qualquer circunstância

ainda que móveis, são raízes

da vida que nos habita

e nos levam por esta terra

sempre Mãe, fértil ainda que ferida e desgastada

pés que ficam

pés que vão

pelos caminhos

ou descaminhos

das escolhas que nos escolhem

e nem sempre acolhem

mas que sempre serão

passos para o que vem

e pintar

o além

a réstia de luz

o entre o agora

e o que vislumbro ser

as flores do caminho

que ainda não se pode ver

das interrogações que me atravessam os dias

Publicado em

será que não te mostrei a parte mais bonita de mim?

ou talvez não arrumei (escondi?) a bagunça a tempo

de esperar aprumada a tua chegada

e tentar fazer do fogo que me habita

uma morada

de calor agradável

mas ao voltar do devaneio

percebo que meu caos se alastrou

borrando a beleza das minhas fantasias

e de novo dou de/quebro a cara com a realidade

e me pergunto o que faltou pra você ver a parte mais bonita de mim

será que teus olhos são míopes (como os meus)?

ou te colocaram as lentes erradas?

ou quem sabe vendas?

te taparam os ouvidos?

te roubaram os sentidos?

ou são os meus medos alucinados

que tem me tapado os ouvidos

e fechado os olhos entorpecidos

pra não ter que encarar

a realidade

que me rouba o ar

 

 

vês? como a vida não é apagável?!

Publicado em

as horas e os dias vão continuar passando

e ainda que às vezes eu quisesse voltar

e rebobinar

não posso impedir a memória de falhar

assim vou desaprendendo todos os dias

para desapegar do passado

mesmo um dia tendo sido pesado

e me pergunto como suspender o tempo

ou fazê-lo passar depressa

pra depois voltar a suspendê-lo

e encontrar o momento exato

em que teus olhos pousaram nos meus

e brilharam

pela primeira

(ou última)

vez

e n o s a r

Publicado em

os nós doem embolados na carne

gritam entalados na garganta

amanhecem emaranhados nos cabelos

presos em si mesmos

em nós mesmos

através ar

Publicado em

todos os dias acordar

mil coisas em que te fizeram acreditar

sem ensinar por onde começar

sem falar no amar

onde é preciso mergulhar

pra qualquer sentido real tocar

a verdade e o real encarar

abraçar, tirar pra dançar

e atravessar

tempos esperas peitos distâncias saudades abismos mundos

  e todo ar

 

 

 

Às margens de linhas tortas

Publicado em

Não sei onde foi que me perdi

nem por que meus olhos resolveram pousar longe

ou quando foi que me distraí de mim

e me peguei escrevendo e vivendo

nas margens de linhas tortas

fugindo de qualquer forma de correção

sigo tentando ser fluxo

dançando a fuga

para que não me descubram

que não me peguem

que não me apaguem

e nem me enquadrem

e se minhas pernas falharem

e todos os esforços não forem suficientes

que ainda assim não me calem

que minhas palavras sejam corpo para minha alma

e voem

Publicado em

de todo ar

criar

um mar

de amar